quarta-feira, 12 de março de 2014

O QUE UM PADRE PODE ENSINAR SOBRE O CASAMENTO, SE ELE NÃO É CASADO?

Entenda por que um sacerdote pode ter muita experiência e conhecimento sobre o dia a dia de um casal, mesmo vivendo o celibato
© Alain PINOGES / CIRIC

Quando conto que estou cursando uma licenciatura em Matrimônio e Família, muitas pessoas costumam rir e me perguntam o que nós, padres, sabemos sobre o casamento, se não somos casados. Como um sacerdote ousa falar de uma realidade da qual ele não tem experiência?
                          
Vou começar esclarecendo um primeiro ponto: os padres são celibatários, mas isso não significa que sejam solteiros. De fato, não estão disponíveis nem livres para nenhuma mulher.

Para entender isso, é preciso ter claro que o nosso ministério sacerdotal não é "nosso" ministério sacerdotal: é o ministério de Jesus, Sacerdote eterno, o único e verdadeiro sacerdote da nova aliança.

O que os padres são e fazem não é uma mera representação da sua ação evangelizadora, mas uma participação direta da sua graça santificante, que lhes deu, em nome de Jesus, um nome, a potestade para submeter o Maligno, perdoar pecados, santificar o amor, ungir os enfermos e mostrar a beleza da sua Palavra.

Tudo isso parece muita pretensão, não é mesmo? Mas esta é a beleza e a grandeza do ministério que foi confiado aos sacerdotes. Nós, padres, não nos apropriamos de privilégios nem atributo algum; só temos responsabilidades das quais prestaremos contas diante do Senhor.

Pois bem, o apóstolo Paulo, em Efésios 5, 25-26, nos diz: Maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela, para santificá-la, purificando-a pela água do batismo com a palavra". Este texto nos mostra claramente a relação esponsal que Cristo tem com a Igreja, da qual é cabeça e ela, seu corpo, fazendo dos dois uma só unidade pelo amor. Cristo é esposo da Igreja e, por isso, se os padres são presença de Cristo na terra, então são verdadeiros esposos da Igreja.

Não estamos diante de uma simples ficção, mas de uma realidade de cunho teológico que se compreende quando permitimos que entrem no nosso coração aquelas palavras de Jesus: "Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus. Quem puder compreender, compreenda" (Mt 19, 12).

Partindo desta perspectiva, conseguimos compreender de que maneira um sacerdote é verdadeiro esposo que tem responsabilidades como as de um casal: geram filhos no batistério e sabem perfeitamente o que significa escutar aqueles que "choram" de madrugada pedindo ajuda ao seu pai.

Os padres sabem o que é educar nas diferenças e ter de perdoar os que se afastam de casa. E sabem também de infidelidades, essas que aparecem na mídia de vez em quando, mostrando a miséria de um coração que também tenta amar e que é frágil como os outros.

Como esposos, os sacerdotes conhecem o perigo da rotina no amor e o desejo que o coração tem de buscar aventuras. Sabem o que significa deitar-se bravo com a esposa, a Igreja, e querer mudá-la permanentemente, porque ela nem sempre encanta com a sua presença.

Há dias em que a esposa Igreja parece feia, desalinhada, mas os padres aprendem a amá-la assim como ela é, e buscam apaixonar-se constantemente por ela, para jamais ter de abandoná-la para buscar amantes furtivas.

Quem acha que os padres não têm nada a ensinar sobre o amor conjugal não faz ideia do que significa ser sacerdote. E o padre que se considera solteiro, tampouco. Os padres são "esposos celibatários", duas palavras que mostram uma aparente contradição, mas que nos permitem entender melhor este mistério de amor.

Além disso, como esposos, os padres têm uma palavra oportuna, de motivação, iluminadora para aqueles outros esposos que precisam enxergar uma luz no fim do túnel, para saber enfrentar o demônio da rotina e do tédio.

Os padres têm uma palavra acertada para aqueles que não veem outra solução para o seu problema a não ser o divórcio, com a enorme frustração e derrota de não ter sabido amar para sempre e a inevitável luta para buscar a justiça, que lhes permita "repartir" os filhos, como se repartem os bens da casa.

Nós, padres, temos experiência no amor matrimonial sim, conhecemos os amores e as infidelidades, sabemos do que estamos falando.

domingo, 9 de março de 2014

NOSSAS TENTAÇÕES COTIDIANAS

Todos enfrentamos tentações, grandes ou pequenas. Com Jesus não foi diferente. O evangelho deste domingo (09/03/2014) apresenta como que a síntese do que possam ser as grandes tentações da humanidade de todos os tempos.
Transformar pedras em pão: resolveria o problema da fome. Mas esse problema não se resolve num passe de mágica. Resolve-se com trabalho remunerado dignamente e com a partilha dos frutos do empenho de todos. A palavra de Deus mostra que o ser humano precisa de alimento, mas também de moradia, saúde, escola... Transformar pedras em pão pode significar sinal de abundância. Jesus não deseja abundância supérflua. Quer justiça e o necessário para uma vida digna para todos. O povo hebreu, no deserto, forjou o projeto de igualdade e fraternidade, e o diabo, no deserto, quer jogar tudo isso por terra.
Lançar-se do pináculo do templo: bom motivo para mostrar o poderio de Deus, usando seu Filho para um espetáculo gratuito. Jesus recusa o papel de messias do espetáculo e do prestígio, que pensa só em si. Deus e a religião são realidades fundamentais, não podem ser ridicularizados nem manipulados em vista de interesses pessoais.
Adorar a riqueza e o poder: eis os grandes ídolos que fascinam o ser humano e sempre foram para ele uma constante tentação, talvez a maior tentação de todos os tempos e a síntese de todas as outras. Jesus propõe o poder como serviço e a riqueza partilhada como dom de Deus em benefício de todos os cidadãos. Ele recusa-se a ser o messias do poder e da riqueza.
Como percebemos, o tentador vem na contramão da proposta de Jesus. O diabo propõe abundância fácil, Jesus propõe justiça; o diabo propõe serviço e partilha. No pai-nosso rezamos a Deus que não nos deixe cair em tentação, principalmente na grande tentação do abandono do projeto de Jesus.

Pe. Nilo Luza, ssp
Retirado de O DOMINGO, semanário litúrgico-catequético, nº 12, 09/03/2014.